25 em cada 100 crianças angolanas não concluíram o ensino primário
O elevado abandono escolar, mesmo na escolaridade obrigatória, e a quantidade de reprovações são apenas o cenário mais visível das dificuldades que afectam alunos, professores e escolas em todo o País. Falta de investimento público no pós-ensino primário coloca em causa a formação técnica e profissional dos jovens.

Publicado a 13 de Fevereiro, pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), o Anuário Estatístico da Educação 2019 faz uma radiografia ao sector da Educação. De acordo com os dados que constam no relatório, entre os 4.929.231 alunos do ensino primário (que vai da 1ª à 6ª classe) naquele ano, 14,1% reprovou e 11,3% abandonou o sistema. No total, 25,4% dos alunos (ou mais de 25 em cada 100 crianças) não concluíram os estudos primários como seria expectável, até porque a escolaridade obrigatória chega à 9ª classe.

O relatório identificou um total de 8.041.386 de alunos matriculados no sistema de ensino, com os homens a representarem a maioria (52%), enquanto as mulheres assumem 48% das inscrições. Entre o número total de alunos, 10% representava a percentagem de matriculados na classe de iniciação (cerca de 753 mil inscrições), 61% correspondia aos matriculados no ensino primário, 18% correspondia aos alunos do I ciclo do ensino secundário (da 7ª à 9ª classe) e 11% representava os alunos matriculados no II ciclo do ensino secundário (da 10ª à 13ª classe).

Em 2019, frequentavam o I ciclo do ensino secundário 910.020 alunos, representando 11% do total, enquanto no II ciclo do ensino secundário estavam registados 753.112 alunos, correspondendo a 9%. O problema do abandono e reprovação no sistema de ensino não se confina ao nível primário. Pelo contrário, as taxas de abandono e reprovação escolar no ano em referência vão aumentando consoante se avança no sistema. No I ciclo do ensino secundário, a taxa de reprovação foi de 21,6% e o abandono representou 10,3%, ou seja, 31,9% dos alunos matriculados naquele ano lectivo não concluíram o plano curricular.

A tendência agrava-se ligeiramente no II ciclo do ensino secundário, com 18,5% de reprovações e 13,7% de abandonos. No total, 32,2% dos alunos também não concluíram os estudos em 2019.

A grande maioria dos alunos está concentrada nas províncias de Luanda, Huambo, Benguela, Huíla, Bié e Uíge. Aquelas seis províncias - as mais povoadas do País - representam cerca de 67% do total de alunos, com as restantes 12 a assumirem um peso de apenas 33%.

Descaso para além do ensino primário

Em relação ao número de escolas, o anuário apurou um total de 14.928 estabelecimentos. Cerca de 80% correspondem ao ensino primário, 12% ao I ciclo do ensino secundário e apenas 8% ao II ciclo do ensino secundário. Esta estrutura de investimento e disponibilidade de escolas públicas demonstra uma aposta nos primeiros anos de formação, ao mesmo tempo que acentua um certo descaso com os restantes níveis de ensino.

Para Mário Rui Pires, consultor e antigo secretário de Estado para o Investimento Público, o estudo do INE "limita-se a apresentar números sem qualquer análise dos resultados, é um mero relatório estatístico. Seria importante perceber por que motivo temos estes indicadores".

"Realmente não é preciso muito para concluir que há problemas na Educação, penso até que a Saúde, actualmente, está melhor do que a Educação. Apesar de termos taxas quantitativas de crescimento nos últimos 20 anos na Educação. Mas, quando vamos olhar para a qualidade...", sublinha o consultor.

Privatização e objectivos falhados

Curiosamente, o investimento do sector privado em construção de escolas supera o esforço do Estado quando se trata do II ciclo do ensino secundário: 54% das escolas naquele nível são privadas, contra apenas 41% de escolas públicas. O próprio INE admite que "os dados revelados mostram que algumas zonas do território nacional carecem de maior investimento do Estado na construção de escolas públicas, para garantir o direito à educação das famílias sem os recursos financeiros demandados pelas escolas privadas".

Os dados demonstram o avanço na privatização da Educação nos níveis pós-ensino primário, com efeitos pesados na formação dos jovens angolanos e no desenvolvimento das suas capacidades técnico-profissionais, especialmente no seio das classes mais pobres, como sublinha o INE. Isaac Paxe, professor universitário e doutorado em Educação pela Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), Brasil, não deixa de reconhecer a importância dos primeiros anos de escolaridade. Mas também alerta para as consequências da falta de investimento nos restantes níveis.

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